Em sessão remota nesta quinta-feira (1º), o Plenário do Senado aprovou o PL 741/2021, projeto de lei que cria o programa Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica e Familiar. Além dessa medida, o projeto insere no Código Penal (Decreto-Lei 2.848, de 1940) o crime de violência psicológica contra a mulher. O texto segue agora para a sanção da Presidência da República.
O projeto, que teve origem em uma iniciativa da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), foi apresentado ao Congresso pela deputada federal Margarete Coelho (PP-PI) e contou com o apoio da bancada feminina. No Senado, a relatora da matéria foi Rose de Freitas (MDB-ES).
Sinal Vermelho
O texto prevê que o Executivo, o Judiciário, o Ministério Público, a Defensoria Pública e órgãos de segurança pública poderão estabelecer parceria com estabelecimentos comerciais privados para o desenvolvimento do programa Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica e Familiar.
Esse programa prevê, entre outras medidas, que a letra X escrita na mão da mulher, preferencialmente na cor vermelha, funcionará como um sinal de denúncia de situação de violência em curso. De acordo com o projeto, a identificação do sinal poderá ser feita pela vítima pessoalmente em repartições públicas e entidades privadas que participem do programa. Em seguida, a vítima deverá ser encaminhada para atendimento especializado.
O texto ainda prevê a realização de ampla campanha de divulgação para informar a população sobre o significado do código do Sinal Vermelho, de maneira a torná-lo facilmente reconhecível por toda a sociedade.
Rose de Freitas destacou que essa medida já vem sendo conduzida por meio da assinatura de convênios e protocolos entre o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), que estabeleceram parcerias com redes de farmácias, drogarias e outros tipos de lojas comerciais a fim de capacitar atendentes para identificar o pedido de socorro de vítimas (quando estas tiverem um X desenhado nas mãos).
— Essa iniciativa se insere entre aquelas destinadas à prevenção da violência e à proteção da mulher, e pode contribuir para evitar a escalada de agressões ocorridas no ambiente doméstico e familiar — apontou a relatora.
Violência psicológica
O projeto também inclui no Código Penal o crime de violência psicológica contra a mulher, a ser atribuído a quem causar dano emocional “que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões” — por meio de ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro método. A pena será de reclusão de seis meses a dois anos e multa.
A proposta ainda inclui na Lei Maria da Penha (Lei 11.340, de 2006) o critério de existência de risco à integridade psicológica da mulher como um dos motivos para o juiz, o delegado, ou mesmo o policial (quando não houver delegado) afastarem imediatamente o agressor do local de convivência com a ofendida. Atualmente isso só pode ser feito em caso de risco à integridade física da vítima.
Redação
Durante a sessão, Rose de Freitas afirmou que o projeto é conveniente e oportuno, mas apontou que o texto carecia “de aperfeiçoamento em sua redação, com a finalidade de expressar com mais acuidade seus objetivos”. Ela sugeriu alguns ajustes no texto e nas referências legais. A Secretaria do Mesa do Senado, no entanto, informou que as mudanças poderiam ser consideradas alterações de mérito, o que faria o projeto ter de ser analisado novamente pelos deputados federais. Diante do aviso, a relatora retirou suas sugestões de mudanças e o projeto foi aprovado da forma como veio da Câmara.
A relatora ainda informou que foram apresentadas nove emendas no Senado. Apesar de elogiar essas sugestões, Rose não acatou nenhuma delas, argumentando que elas alterariam o mérito do texto e, por isso, fariam o projeto retornar à Câmara.
De acordo com a relatora, o índice de violência contra a mulher no Brasil aumentou cerca de 75% durante a pandemia — que ainda não acabou. Por isso, destacou ela, “nos deparamos com a necessidade de que esta lei entre em vigor o quanto antes”. Rose cobrou mais justiça para evitar a violência contra as mulheres.
— A gente sabe que cada dia é um dia, cada luta é uma luta. Mas vamos vencer pela cultura, pela educação e pela obstinação das mulheres.
Elogios
Líder da bancada feminina no Senado, Simone Tebet (MDB-MS) se disse emocionada com a votação do projeto. Ela afirmou que Rose de Freitas é um “baluarte” na defesa das mulheres. Simone citou a estimativa de que cinco mulheres morrem por dia no Brasil vítimas de violência doméstica. A senadora Leila Barros (PSB-DF) elogiou a iniciativa e disse que o projeto é uma conquista “para todas as mulheres”. E a senadora Zenaide Maia (Pros-RN) declarou que o texto tem o mérito de ampliar os espaços de denúncia.
Para os senadores Marcelo Castro (MDB-PI) e Esperidião Amin (PP-SC), o trabalho da autora e da relatora do projeto honra todas as mulheres do Congresso Nacional. O senador Paulo Rocha (PT-PA) disse que a aprovação do projeto mostra que o país deve ter orgulho da mulher brasileira. O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) ressaltou a importância da matéria para combater a violência doméstica. E o senador Carlos Viana (PSD-MG) confirmou o apoio do governo à matéria, além de elogiar o trabalho de Rose de Freitas.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, parabenizou “todas as envolvidas” na produção e na tramitação da matéria. Ele destacou que a aprovação do texto ocorreu de forma unânime (com 69 votos favoráveis e nenhum contrário). Pacheco também registrou que a presidente da AMB, Renata Gil, acompanhou a votação da matéria no Plenário do Senado. Os senadores Nelsinho Trad (PSD-MS), Telmário Mota (Pros-RR) e Izalci Lucas (PSDB-DF) também elogiaram o trabalho da relatora.
— Quando a senadora Rose relata um projeto, a gente presta atenção e sai melhor do que entrou — afirmou Nelsinho.
Escalada
De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o número de feminicídios aumentou 7,1% em 2019 em relação a 2018. Os dados ainda mostram que as mulheres enfrentam grandes dificuldades para denunciar a violência ou a ameaça de que são vítimas. O Governo do Distrito Federal, por exemplo, informa que 94% das vítimas de feminicídio em 2020 não realizaram boletim de ocorrência nem fizeram denúncia antes da fatalidade. Muitas mulheres não buscam ajuda devido à vergonha, ao medo de represálias, ao atendimento (que pode ser precário, inexistente ou pouco acolhedor) ou à falta de conhecimento sobre como ter acesso à ajuda disponível.
Nesse contexto, o CNJ e a AMB lançaram em junho de 2020 a Campanha Sinal Vermelho, por sugestão de um grupo de trabalho criado para elaborar estudos e ações emergenciais visando ajudar as vítimas de violência doméstica durante a fase do isolamento social provocada pela pandemia. O PL 741/2021, aprovado pelo Senado nesta quinta-feira, transforma essa campanha em lei, obrigando Executivo, Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública a implementá-la.
O senador Paulo Paim (PT-RS) elogiou o trabalho da deputada federal Margarete Coelho e da senadora Rose de Freitas na condução da matéria. Citando o Mapa da Violência, ele também informou que uma a cada quatro mulheres com idade acima de 16 anos sofreu algum tipo de violência durante a pandemia. Segundo o senador, esse número evidencia a importância do projeto.
— Uma situação inaceitável. A omissão também mata — alertou ele.
fonte: SENADO FEDERAL